Especialistas falam sobre mecanismos anticrise e onde está o verdadeiro inimigo

Após seis meses de pandemia, e ainda sem a definição de uma vacina ou cura para a Covid-19, profissionais da Administração já cogitam o prolongamento da crise sanitária e econômica. Com o planejamento para 2021 em vista, empresários já pensam em possíveis novas ondas de contágio e se perguntam como reagir ao cenário econômico do próximo ano, sobretudo, para as organizações já combalidas pelas perdas financeiras. Segundo o administrador e pesquisador, Gabriel Martins, o redirecionamento de negócios é condição essencial não apenas para sobreviver diante da intempérie, como também para obter lucro. Ele ressalta que é preciso observar o comportamento do consumidor, durante e após a crise, pois será indicativo de saturação ou surgimento de novas necessidades. Martins também destaca a necessidade de conhecer novos canais de vendas e investir em diversificação de escoamento. No quesito inovação, ele frisa que as mudanças das necessidades percebidas pelo cliente podem ser indícios do que vem pela frente. “Aqueles que tiveram fechamento parcial podem aproveitar esse tempo para reformular suas estratégias, lançar novos produtos ou novas modalidades de serviços. O empresário não pode deixar de atender a demanda atual, na forma que o mercado deseja e precisa”, avalia. Vetores de negócio Para superar a crise, o administrador enfatiza a importância de gerir os principais ‘vetores de negócios’, enumerados pela pesquisadora em finanças corporativas, Ruth Bender, autora do livro “Corporate Financial Strategy”. Segundo ela, entre os principais vetores a serem considerados, a qualquer tempo, estão o controle dos crescimentos de vendas e das margens de lucro — além de esperar o amadurecimento de estratégias e diferenciais competitivos. Bender destaca que é preciso calcular as alíquotas (taxa percentual de quanto um tributo incide sobre o objeto taxado), e definir de forma exata o capital de giro, além de investi-lo corretamente. Também alerta sobre a importância de investir em ativos de longo prazo e ter claro o custo de capital (valor que a empresa precisa obter de lucro para que o negócio se pague). “É necessário administrar os riscos, sobretudo, para aumentar o retorno posterior mesmo durante a pandemia. Nesse processo é importante, também, administrar bem o capital intelectual — de onde surgem as tecnologias —, as competências e o Goodwill (potencial de bens e negócios gerarem lucros)”, analisa Martins. Flexibilidade Para o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), Carlos Alberto Ramos, a palavra do momento é ‘flexibilidade’. Ele dá como exemplo o caso de novas contratações e diz que o mais prudente é apelar para horas extras: deste modo não haverá novos encargos trabalhistas, caso o empresário seja obrigado a desligar novos colaboradores contratados. De acordo com Ramos, além de reduzir custos (de acordo com os diferentes cenários), é preciso conservar a liquidez e evitar empreendimentos que não possam ser revertidos ou ajustados de forma rápida. Ressalta, ainda, a importância de dominar novas tecnologias, pois o cenário está propenso ao crescimento da influência e do poder dos novos aparatos sobre os negócios. “Sem dúvida, em qualquer cenário possível, no futuro, a tendência à utilização de ferramentas tecnológicas será aprofundada. Por isso, aquele que não dominar ferramentas e processos movidos pela computação não é e nem será competitivo”, sentencia. Concorrência 24h Para o administrador e empresário Carlos Oshiro a pandemia trouxe uma ruptura sistemática entre o que chamou de ‘Velha (Economia)’ e ‘Nova Economia’. A primeira era pautada em grandes investimentos, sobretudo, em marketing e publicidade, bem como em previsibilidade de cenários de médio e longo prazo. Já na ‘Nova Economia’, a condição essencial para sobreviver é lidar com o inesperado, bem como investir e dominar tecnologias, sobretudo as disruptivas. Técnicas e ferramentas de marketing e publicidade, digitais, podem ser aproveitadas para obter o mesmo resultado conseguido no passado, por grandes e caras campanhas. Outro divisor de águas, apontados por Oshiro, é a internacionalização da economia. Ele ressalta que muitos empresários acreditam que a crise em seus negócios tem a ver apenas com a pandemia: pensam que na volta à normalidade sanitária voltarão a crescer, mas se esquecem do fator concorrencial externo. “Na realidade, não é mais a crise. Existem, hoje, vários concorrentes ao redor do mundo, que ele não sabe onde estão. Talvez até seja uma empresa comandada por jovens de 18 a 24 anos que estão vendendo 24h por dia (on-line) e estão tomando clientes, mas ele não percebe, pois só abre durante as dez horas comerciais”, enfatiza. Por Leon Santos – Assessoria de Comunicação CFA
Pesquisadoras falam de suas trajetórias profissionais no universo científico

Em tempos de Covid-19, a importância da ciência ficou ainda mais em evidência. Afinal, é por meio dela que a doença é estudada e vacinas estão sendo testadas. No Brasil, contudo, os cientistas enfrentam enormes dificuldades ligadas à falta de incentivo. Ainda sim, o país tem muitos pesquisadores e alguns, inclusive, mesmo com todas as adversidades, estão debruçados para compreender melhor o novo coronavírus. Um desses profissionais é a cientista Jaqueline Goes de Jesus. Ela foi convidada, no último dia 5, para compor uma uma equipe de pesquisadores da Organização das Nações Unidas (ONU) após ter sequenciado os primeiros genomas do novo coronavírus na América Latina. Outra cientista brasileira também ganhou destaque recentemente: é a pesquisadora sênior de saúde global do Conselho de Relações Exteriores dos EUA, Luciana Borio. Ela fará parte do conselho consultivo para o combate à Covid-19 na gestão do presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden. Mas, afinal, o que essas mulheres têm em comum? Ambas dedicam a vida à pesquisa científica, uma área que, culturalmente, sempre foi dominada por homens. Para mudar esse cenário, o III Fórum das Mulheres da Administração promoverá um dia dedicado ao tema “Mulheres na Ciência”. O evento, realizado pela Comissão Especial ADM Mulher do Conselho Federal de Administração (CFA), acontecerá de 24 a 26 de novembro, por meio do canal CFAPlay. Em 2020, Márcia foi eleita uma das 20 mulheres mais poderosas do Brasil em pela revista Forbes. Uma das convidadas para falar do assunto é a professora Titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e diretora da Academia Brasileira de Ciências, Márcia Barbosa. Ela conta que ainda é muito baixa a participação feminina no universo científico. “As mulheres são no mundo somente 30% das cientistas. Se restringirmos ciências exatas, este número cai para entre 10% a 20%. Dentro deste quadro ruim, subir na carreira é o grande obstáculo. Só para dar uma ideia, na Academia Brasileira de Ciências (o que seria equivalente a ser conselheiro de uma empresa), as mulheres são 16%. O fato de o percentual de mulheres diminuir à medida em que se sobe na carreira é um dos grandes problemas”, explica. Márcia é graduada, mestre e doutora em Física. Ela era minoria em um curso dominado por homens e foi preciso superar muitos desafios. “Percebi que era o elefante na sala quando entrei em aula e era uma das oito mulheres em oitenta alunos na minha graduação. Olhei em volta e não via mulheres liderando. Física é apaixonante! Portanto, segui apesar dos obstáculos de ser ignorada, subestimada e ultrajada. Enfrentei o menu de Gaslighting, Mansplaining, Manterrupting, Bropriating, mas tinha colegas e companheiras que me apoiavam no caminho”, relembra a cientista. Sobre o futuro das mulheres na ciência, Márcia é otimista. “O mundo está mudando. As jovens hoje têm uma enorme consciência do problema. A minha geração naturalizava. Eu tenho esperança, pois a luta de quem veio antes de mim e da minha geração está pavimentando o caminho para a equidade”, afirma. Ciência e maternidade Quem também estará no III Fórum das Mulheres da Administração é a neurocientista, doutora em Fisiologia e professora associada na Universidade Federal do Pampa (Unipampa), campus Uruguaiana-RS, Pâmela Billig Mello Carpes. Como Márcia, ela também precisou superar muitos obstáculos. Pâmela Billig: neurocientista e mãe. O interesse em ser cientista nasceu quando cursava Fisioterapia. Contudo, ao final da graduação, Pâmela ficou grávida e seguir com o planos de fazer mestrado e doutorado, títulos essenciais para a carreira científica, foi um desafio. “Tive dificuldades em encontrar um orientador que considerasse possível conciliar a ciência com a maternidade. Depois que encontrei, fiz mestrado e doutorado em quatro anos e então me tornei professora na Universidade Federal do Pampa, iniciando meu próprio grupo de pesquisa. Na Unipampa encontrei oportunidades e espaço para crescimento de desenvolvimento das minhas pesquisas, de tal forma que gradativamente fui sendo reconhecida pelos meus pares”, conta a cientista. Esse reconhecimento rendeu, por sinal, alguns prêmios como o Prêmio para Mulheres na Ciência, da L’Oreal em parceria com a Unesco e a Academia Brasileira de Ciências, que ela ganhou em 2017 por um projeto que buscou entender melhor como o cuidado, ou a falta dele, nos primeiros anos de vida da criança impacta o cérebro e o desenvolvimento das suas funções. Em 2018, ela trabalhou no Escritório de Educação da Unesco, em Genebra, e hoje é bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisa. Pâmela diz que as mulheres já enfrentaram – e ainda enfrentam – muitos desafios na ciência. “As poucas mulheres que conseguiam fazer ciência muitas vezes não tinham seu trabalho reconhecido. Rosalind Franklin é um bom exemplo. Ela teve um papel fundamental na descoberta da estrutura do DNA e isso só foi reconhecido muito recentemente. O mérito foi para uma dupla de cientistas homens que, inclusive, se apropriou do trabalho da cientista”, aponta. Hoje, o cenário do universo feminino no meio científico é outro. “Atualmente é muito mais fácil para as mulheres ingressarem na ciência, mas isso não garante ausência de desafios. Eles são outros. A progressão na carreira é mais lenta, a maternidade tem um grande impacto, há muitos relatos de assédio no ambiente acadêmico-científico, etc”, pontua Pâmela. Para ajudar outras mulheres e mães cientistas ela passou a fazer parte do grupo Parent in Science. “Tenho muito orgulho de fazer parte deste movimento. Ele trouxe à tona o tema parentalidade e ciência e fez com que olhássemos para as mães cientistas com olhos mais inclusivos. Somos muitas e várias vezes achamos que estamos sós. Tivemos muitos avanços nestes últimos três a quatro anos. Realizamos eventos e discussões com agências de fomento, conseguimos incluir na análise do currículo de editais de agências de fomento à pesquisa e de algumas universidades a consideração da maternidade na análise do currículo de cientistas mães, compartilhamos diretrizes para ambientes acadêmicos mais inclusivos, divulgamos dados acerca do impacto da maternidade e paternidade na produtividade das/dos cientistas, inclusive durante a pandemia, entre outros”, cita. Pâmela diz, ainda, que há muitos desafios e
Revolução 5.0 chegou ao Brasil e já divide o cenário com sua antecessora

É quase impossível não pensar nos fenômenos econômicos e sociais que moldarão o futuro dos brasileiros nos próximos anos. E não é apenas em razão da pandemia, mas sim em virtude da Quarta e Quinta Revoluções Industriais, que já aconteciam no restante do mundo, mas ainda engatinham no Brasil. Há exato um ano, na edição 132 da RBA (setembro/outubro), o tema de capa foi a Quarta Revolução Industrial (Revolução 4.0). Na época, ainda pouco conhecido no Brasil, o fenômeno foi abordado em razão de sua importância e de sua chegada, ainda que a passos lentos, no cenário nacional. Por outro lado, em diferentes partes do mundo, a Revolução 4.0 já estava em tal grau de amadurecimento que levou o ‘Fórum Econômico Mundial’, no início deste ano, a tratar as transformações socioeconômicas atuais como efeitos da Quinta Revolução Industrial (ou Revolução 5.0). A rapidez com que os fatos se sucederam fez com que um movimento tecnológico-industrial substituísse o outro, em menos de oito anos (2011 a 2019). Segundo a administradora e professora da Universidade de Brasília (UnB), Débora Barem, a Revolução 4.0 foi um desdobramento natural das revoluções que a precederam, em razão das lógicas econômicas existentes anteriormente, mas agora acrescidas do fenômeno digital e disruptivo da atualidade. Construídos com base em Inteligência Artificial (IA), Internet das Coisas (IoT) e automação, em geral, as máquinas ganharam capacidade de pensar, executar funções e tomar decisões sem a necessidade de comandos humanos. Já a Quinta Revolução Industrial aparece, na visão da pesquisadora, como resposta ao futuro da população mundial, sobretudo, diante do quadro de envelhecimento, na maior parte dos países. O dilema gira em torno sobre o que será feito de bilhões de trabalhadores, mundo afora, caso sejam substituídos por máquinas a qualquer instante. “A Revolução 5.0 expressa a preocupação existente sobre as consequências sociais do novo fenômeno. Há milhares de países que vivem momentos completamente distintos, em relação ao contexto tecnológico e econômico atual, com isso aumentam ainda mais as desigualdades”, diz a professora. Funcionamento Do ponto de vista técnico, o engenheiro e professor da faculdade de engenharia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Marcelo Segatto, esclarece que na Revolução 5.0 as máquinas passam a trabalhar de modo cooperativo com os humanos. Deste modo, segundo ele, haverá maior exigência das máquinas nos quesitos compreensão de gestos, fala e até das alterações de humor dos seres humanos. Ao fazer análise sobre adaptação do Brasil ao novo cenário, Segatto alerta, no entanto, sobre a necessidade de repensar o modelo pedagógico vigente, tendo em vista o contexto tecnológico nacional e as tendências mundiais. Ele ressalta que as habilidades necessárias para acompanhar a Quarta e Quinta Revoluções surtirão efeito, apenas, se for equilibrado déficit educacional da população brasileira e criada cultura de que ciência é parte da natureza e do dia a dia das pessoas. “A quinta revolução não chegará ao Brasil, enquanto não vivermos a Revolução 4.0. O trabalhador desse novo quadro que se desenha deverá ser um profissional mais qualificado, e isso exigirá mais tempo de formação e mudança nos processos de profissionalização”, analisa. Visão do mercado A principal novidade da Revolução 5.0 será promover benefícios tangíveis, não apenas para os negócios ou governos, mas também agir a favor das pessoas, na visão do especialista em transformação digital, Enio Klein. Entre os efeitos gerados, ele aposta, ainda, na busca de mais agilidade, produtividade e aumento de receita, em virtude da redução dos custos de produção e processos. Segundo Klein, a Quinta Revolução Industrial está alinhada com os “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, previstos na agenda da Organização das Nações Unidas (ONU), para 2030. Em teoria, embora exista a possibilidade de ser implementado em qualquer lugar, ele avalia que o Brasil ainda não está preparado para nenhuma das duas revoluções industriais. “O que vemos são ilhas de desenvolvimento extremamente avançadas e bolsões de atraso gigantescos. Assim como temos desigualdades sociais, temos também desigualdades organizacionais”, avalia. Na opinião do também empresário, Fernando Taliberti, a Revolução 5.0 une a capacidade humana às potencialidades da máquina, por meio de dispositivos e tecnologias capazes de provocar novos paradigmas de evolução. Embora o Brasil ainda esteja atrás de outros países, em termos de educação e tecnologia, ele é otimista em relação às qualificações do país em relação ao futuro. “O brasileiro tem uma característica que pode ajudar bastante nesse novo contexto. Nossa pluralidade cultural, criativa e flexibilidade estão entre as características humanas que diferenciam justamente a Quarta da Quinta Revolução Industrial”, sentencia. Por Leon Santos – Assessoria de Comunicação CFA